À pergunta do subtítulo do livro de Franco Garelli ‘Pequenos
ateus crescem’. Realmente uma geração sem Deus? Gostar-se-ia de
responder: “Sem Deus talvez não, mas sem a Igreja certamente”.
A reportagem é de Marco Marzano, publicada por il Fatto Quotidiano, 01-08-2016. A tradução é de Benno Dischinger.
São dois os dados que sobressaem entre aqueles apresentados pelo sociólogo de Turim nesta sua nova indagação sobre jovens italianos e a fé.
O primeiro é o aumento, impressionante, em diversas formas (ateísmo,
indiferença religiosa, agnosticismo, “ateísmo prático”), do não crer em
Deus. O segundo é o crescimento (já relevado por outras pesquisas),
entre aqueles que ainda creem, de formas de espiritualidade “faz por
ti”, ligadas só debilmente à tradição religiosa e fundadas numa
elaboração pessoal, numa peculiar relação com a prece, a divindade, o
ultramundano.
São dados que confirmam uma tendência de profundo afastamento dos jovens
da Igreja Católica, dos seus símbolos, dos seus rituais, das suas
práticas. “Da Igreja Católica salvo o empenho com os pobres e os
necessitados”, diz um dos entrevistados pela equipe de Garelli, ou seja,
o trabalho da Caritas, a atividade assistencial das
paróquias. O restante, ou seja, o magistério verdadeiro e próprio à
grande maioria dos jovens não diz propriamente nada. Também do atual
Papa agrada a tantos o fato de que pareça mais interessado nas questões
sociais e políticas do que naquelas propriamente religiosas.
Diante desta situação, o que pode fazer a Igreja Católica? Deve
mostrar-se intransigente e resistir, enrijecida em defesa da tradição ou
adaptar-se às inéditas exigências espirituais dos jovens, ir ao
encontro deles atualizando a sua mensagem?
O coração diz a muitos de nós, de esquerda, e com simpatias
reformadoras que, para enfrentar esta situação, a Igreja deveria
finalmente modernizar-se, abrindo-se aos valores difundidos na nossa
sociedade: à liberdade de consciência, à autonomia do sujeito, ao
pluralismo das relações afetivas. Os hierarcas católicos, caso queiram
encontrar a complacência dos jovens, deveriam parar de condenar a homossexualidade, aceitar o sexo pré-matrimonial, conceder o sacerdócio às mulheres, etc.
Mas a razão adverte que o número de não crentes, como é confirmado pela pesquisa de Garelli,
está entre os jovens em aumento exponencial e isto significa que é
sempre mais amplo o número de pessoas completamente estranhas ao
“mercado religioso”.
Na Grã Bretanha todas as reformas que os progressistas auspicam foram feitas (pela Igreja anglicana):
as igrejas estão mais vazias do que nunca. Também aqueles que
mantiveram algum interesse pela dimensão espiritual não estão
interessados em cultivá-lo numa dimensão eclesiástica, ou seja coletiva,
que implique em um pertencimento estável, uma fidelidade de fundo, uma
continuidade vinculante.
A isto somos refratários nós contemporâneos, também na dimensão da
fé. A cifra que caracteriza a existência dos jovens ocidentais é aquela
da incerteza, não só aquela induzida pelo mercado e suportada como um
fardo injusto, mas também aquela escolhida e tornada estilo de vida. A
nossa verdadeira religião tornou-se a dúvida. Aqueles que ainda são
cristãos se tornaram implicitamente protestantes.
Que espaço têm as igrejas, aquelas reformistas e aquelas
conservadoras, num tal cenário? Nenhum ou quase nenhum. Ao deixar a
velha via pela nova, as instituições como a Igreja correm o risco
somente de perder também os extremos resíduos de sua antiga potência cultural.
Por querer abrir as portas a quem em paróquia não entrará em todo
caso jamais, a Igreja expor-se-ia ao risco de perder “aquilo que resta
dos católicos”, ou seja, aquelas atualmente poucas e portanto preciosas
ovelhinhas que, sobretudo no interior dos movimentos eclesiais ou nas
paróquias do Norte, ainda olham para ela com confiança. Para não falar
daquilo que a Igreja correria o risco de perder se realmente se tornasse
“pobre”, se renunciasse a haveres, contribuições, isenções,
privilégios, instituições de crédito. Ou ao desastre que uma virada
progressista comportaria fora da Europa, por exemplo, na África, onde o catolicismo (tradicionalismo) cresce entre os fiéis e os sacerdotes.
Adotando este ponto de vista, se compreende como o atual Pontífice representa uma maravilhosa resposta à crise do catolicismo.
Francisco é um Papa pleno de
humanidade, um extraordinário comunicador capaz de dar a impressão de
que esteja aí para mudar, sem que depois nada mude realmente, sem que
nenhuma reforma autêntica jamais seja introduzida para modificar os
seculares arranjos internos. Grande retórica que vem acompanhada por
fixidez institucional.
Em suma, a Igreja não parece ter perdido a sua milenar sabedoria: os
hierarcas sabem que as únicas reformas aceitáveis para não comprometer o
futuro da organização são aquelas cosméticas.
Por isso evitaram colocar no degrau mais alto da organização um Gorbatchov,
isto é, um verdadeiro reformador que, como ocorreu na Rússia comunista
dos anos 1980 com o início da perestroika, que, subtraindo ao edifício
um pouco de tijolos com a intenção de reforçá-lo e renová-lo, provocou
seu desmoronamento definitivo. Isto à Igreja Católica, para sorte sua,
ainda não sucedeu.
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