Por Fabrício Veliq*
Observar os indícios revela nossa contínua luta para termos domínio sobre as coisas.
Gosto de pensar sobre as inseguranças.
Não dificilmente nos vemos rodeados por elas. Seja ao decidir um
emprego, uma compra, um relacionamento, a insegurança é algo que sempre
vem a nós e nos atormenta.
Perguntas do tipo: “será que estou fazendo o negócio certo?” “Será que é
a pessoa certa?” “Será que é o emprego certo?” “Será que é a hora
certa?” e tantos outros “serás” que temos que lidar ao longo de nossa
vida e que determinaram nosso futuro são constantes e todos nós passamos
por isso em algum momento de nossas vidas; decisões importantes que nos
fazem querer ter a segurança de um "sim" em todas essas questões para,
no final, decidirmos firmemente sobre alguma coisa.
Embora saibamos que nunca poderemos ter certeza daquilo que nossas
decisões nos acarretará, observar os indícios sempre nos ajudam a tomar
decisões mais acertadas diante das situações que chegam até nós. Mas,
não seria essa observação dos indícios, também, uma tentativa de
segurança para nós mesmos? Não digo para não o fazermos. Observar os
indícios é importante para não entrarmos em situações das quais nos
arrependeremos posteriormente, contudo, chamo a atenção de que estamos
sempre no afã do domínio das situações que nos advém. A meu ver, isso
revela nossa contínua luta para termos domínio sobre as coisas. Perceber
que, na maioria das vezes, não conseguimos é se deparar com a constante
insegurança do mundo o que, sem dúvida tende a nos causar medo.
Com isso em mente, gostaria de propor dois pontos nos quais considero
que Jesus foi um acontecimento de insegurança para o seu povo e seus
discípulos.
Em primeiro lugar, ao mudar a concepção antiga do que seria o domínio do
Messias. Nesse sentido, Jesus frustra a todos aqueles que esperavam o
domínio político e a libertação do domínio romano e o estabelecimento de
um governo judeu onde Deus seria o real governante do povo através de
seu ungido. Pensemos a nós mesmos como judeus no tempo de Jesus. Como
eu, enquanto judeu que cresci ouvindo que o Messias se sentaria no trono
e reinaria eternamente, posso acreditar em um que se diz Messias, mas
ao mesmo tempo é condenado como ladrão e escória da sociedade romana de
meu tempo? Não seria isso um aspecto de extrema insegurança para quem
quer que houvesse crido nele? Daria para ter segurança em um Messias
assim? Acredito que em sã consciência, não.
Em segundo lugar, Jesus traz uma insegurança para aqueles que confiavam e
se consideravam justos devido à obediência às leis judaicas. Vale
lembrar que a lei de Moisés também servia para separar o justo do
injusto, o que segue a Deus e o que não segue. Jesus, ao transgredir
diversos aspectos da lei judaica, vem mostrar que o modo pelo qual
agimos como Deus, a forma pela qual a nova adoração a Deus devia ser
feita, o novo lugar no qual Deus deveria ser adorado, tudo isso teria um
novo significado e plenitude através do viver como Ele viveu, ou seja,
em total abertura a Deus e ao próximo. Por isso do ter se tornado um
“escândalo para os judeus” como bem aponta Paulo em sua primeira carta
aos Coríntios. Afinal, quem poderia mudar a lei senão quem fosse seu
autor? Jesus, ao fazer essas mudanças, como bem pontua Jacob Neusner, se
coloca no lugar do próprio Deus, o que para um judeu era algo
inconcebível e até mesmo blasfemo. Nesse sentido, Jesus também não
trazia nenhuma segurança para aqueles que se apoiavam na lei e tinham
certeza a respeito da forma como deveriam agir e viver no mundo.
Nesses dois casos, Jesus se mostra como aquele que abala a segurança de
seu povo: tanto daquela trazida pela lei, quanto da trazida pela
tradição de espera do messias e, nesse sentido, convida aos seus
seguidores e seguidoras a se lançarem diante da insegurança que Ele
trazia, em total esperança de que Nele se cumpria a promessa feita por
Deus à Abraão.
Hoje em dia vemos um convite diferente do proposto por Jesus. Somos
convidados às certezas e às convicções. Esquecemos que, para seguir no
caminho de Jesus, nada temos além da esperança de que aquele que disse
cumprirá sua palavra para nós.
E assim, na caminhada, continuamos a perguntar como João Batista: "És tu
aquele que deveria de vir, ou esperaremos outro?" sem nenhuma
segurança, a não ser a esperança de que nesse judeu, Deus pronunciou o
seu "sim" para nós em cumprimento à sua promessa.
*Fabrício Veliq é mestre e doutorando em teologia pela
Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE), formado em matemática e
graduando em filosofia pela UFMG. Atualmente ministra cursos de teologia
no curso de Teologia para Leigos do Colégio Santo Antônio, ligado à
ordem Franciscana. É protestante e ama falar sobre teologia em suas
diversas conversas por aí.
Nenhum comentário:
Postar um comentário