sábado, 28 de maio de 2016

Estando o rei para morrer, corroído de vermes, chamou o filho e disse…


"Príncipe, vê como se morre, e aonde vêm a parar as grandezas do mundo"




O rei de Espanha, estando para morrer, mandou chamar o filho e, entreabrindo as vestes reais, mostrou-lhe o peito roído de vermes, dizendo:
– Príncipe, vê como se morre, e aonde vêm a parar as grandezas do mundo.
Depois exclamou:
– Quem me dera ter sido simples frade de qualquer ordem e não monarca!
Ao mesmo tempo, mandou lançar ao pescoço uma corda da qual pendia uma cruz de madeira, e, tendo disposto tudo para a morte, acrescentou:
– Meu filho, quis que estivesses presente a este ato para veres bem como na morte o mundo trata os próprios reis. Quem tiver vivido melhor, achará lugar melhor junto de Deus.
Esse filho, depois Felipe II, quando, por sua vez, estava para morrer na idade de 23 anos, disse:
– Meus vassalos, não faleis no meu elogio fúnebre senão no que estais vendo agora. Dizei que na morte de nada serve ser rei, senão para sentir maior tormento de o haver sido.
Em seguida, exclamou:
– Prouvera a Deus que nunca tivesse sido rei e tivesse vivido num deserto no serviço de Deus! Poderia apresentar-me agora com mais confiança ao seu tribunal e não correria tamanho risco de me condenar.
De que servem, porém, tais desejos na hora da morte senão para maior mágoa e desespero do que não amou a Deus durante a vida?
Com razão dizia Santa Teresa: Não se deve fazer caso das coisas que acabam com a vida; a verdadeira vida consiste em viver de tal modo que não se tenha de recear a morte. Se desejamos ver o que valem os bens da terra, consideremo-los com os olhos fitos na morte e digamos: as honras, as dignidades, os prazeres, as riquezas acabarão um dia: assim atendamos em nos fazer santos e ricos daqueles bens que nos acompanharão para a eternidade e nos tornarão contentes para sempre.
Ah, meu Redentor, padecestes tantos sofrimentos e ignomínias por meu amor, e eu amei tanto os prazeres e bens passageiros deste mundo que, por causa deles, cheguei a calcar aos pés a vossa graça. Mas se Vós, quando eu Vos desprezava, não deixastes de me procurar, não posso temer, ó meu Jesus, que me rejeiteis agora que Vos procuro e Vos amo de todo o coração e me arrependo mais de Vos ter ofendido que se tivesse sofrido qualquer outra desgraça.
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Santo Afonso Maria de Ligório – Extraído de Meditações, Para todos os Dias e Festas do Ano, Tomo II

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