segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

“Outro muro que cai em nome do Concílio”


“Um pequeno gesto com grande significado simbólico: a salvação não é somente para alguns, mas para todos”. Comenta assim Andrea Grillo, professor ordinário de Teologia dos sacramentos e de Filosofia da religião junto ao Pontifício Ateneu Santo Anselmo em Roma, a modificação das normas litúrgicas que disciplinam o tradicional rito da lavação dos pés. Em 2013, depois que o Papa admitiu ao rito duas mulheres, surgiram polêmicas.
A entrevista é de Paolo Rodari, publicada por Repubblica, 22-01-2016. A tradução é de Benno Dischinger.
Eis a entrevista.

Por  que?

Houve certo murmúrio simplesmente porque as rubricas não o permitiam. Ainda se era fiel às normas de 1955 e para certo mundo as mulheres próximo ao altar eram algo inadmissível. Mas Francisco fez ver uma coisa importante: as normas têm sentido se obedecem a um desígnio maior que é, em concreto, o anúncio da salvação para todos”. Na carta de 2014 o Papa diz que “é preciso restituir pleno significado ao signo.“
Escreve-o o Papa e, em substância, a coisa é repetida também no decreto: devolver significado ao signo é uma expressão já presente na reforma litúrgica do Concílio Vaticano II. É preciso retornar ao sentido originário do lava-pés, ou seja, a total dedicação de Cristo, mas também a extensão de sua caridade sem limites. Tudo isso se insere profundamente naquilo que Francisco sempre repete, a necessidade de uma misericórdia que não encontra mais limites, neste caso os limites formais que limitavam a lavação dos pés somente aos machos. Os limites estão superados. A simbologia é forte: a salvação não é para alguns, mas para todos.  

Francisco, neste sentido, aplica até o fundo o Concílio?

Certamente o seu é um ato que indica uma linha de fidelidade ao Concílio. A liturgia é certamente obediência às normas, mas também o reconhecimento que as normas respondem a um desígnio maior, precisamente o anúncio da salvação. Se o Papa tivesse, ao invés, simplesmente obedecido às rubricas, ele teria traído a tradição. Ao invés, superar a rubrica significa adequá-la aos tempos, torná-la atual e, portanto, visível.
É, sob todos os efeitos, outro muro formal que é abatido em nome de uma lógica mais profunda.
Sobre esta base outras normas poderão mudar, por exemplo, a possibilidade do canto no momento do abraço da paz, uma possibilidade que hoje ainda é considerada um abuso.

É também uma visão machista da Igreja que, a seu ver, vem a cair?

Eu não diria tanto. Trata-se simplesmente de mudar rubricas que precedentemente falavam ao homem excluindo as mulheres. Agora, além das mulheres, são admitidos todos: jovens, anciãos, sadios, enfermos e também, como o demonstrou o Papa nestes três anos, os pecadores. E é uma novidade importante, se se pensa no fato de que o mesmo lavar os pés não é somente caridade, mas também iniciação: Cristo deixa uma consigna do que é a comunhão com o Pai.

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