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Por Andrea Tornielli
O "catálogo das virtudes" se articula, assim, em torno das 12 letras que a compõem: Misericórdia.
É uma ''análise acróstica" da palavra "m-i-s-e-r-i-c-ó-r-d-i-a".
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"A reforma seguirá em frente com vigor, lucidez e
determinação." Mas os escândalos não poderão ofuscar a importância do
trabalho que a Cúria Romana, "com dedicação, presta ao papa e a toda a
Igreja". Francisco disse isso na manhã de segunda, no tradicional
discurso para os votos de Natal à Cúria, na Sala Clementina.
Bergoglio, que no ano passado tinha pronunciado um forte
discurso, listando as "doenças" que podem afetar "todo cristão, Cúria,
comunidade, congregação, paróquia e movimento eclesial" e que "requerem
prevenção, vigilância, cuidado e, infelizmente, em alguns casos,
intervenções dolorosas e prolongadas", neste ano ofereceu um catálogo
positivo das virtudes necessárias para aqueles que trabalham na Cúria.
No seu discurso, o papa lembrou que algumas das doenças denunciadas
em dezembro de 2014 "se manifestaram durante este ano, causando muita
dor em todo o corpo e ferindo muitas almas". Uma referência que inclui o
caso Vatileaks, mas também outros fatos.
"Parece necessário afirmar que isso foi e sempre será –
garante Francisco – objeto de sincera reflexão e decisivos
procedimentos. A reforma seguirá em frente com determinação, lucidez e
resolução, porque Ecclesia semper reformanda".
No entanto, especifica o pontífice, "até mesmo os escândalos não
poderão esconder a eficiência dos serviços que a Cúria Romana, com
esforço, com responsabilidade, com empenho e dedicação presta ao papa e a
toda a Igreja, e isso é uma verdadeira consolação".
Por isso, explica, "seria uma grande injustiça não expressar uma
profunda gratidão e um necessário encorajamento a todas as pessoas sãs e
honestas que trabalham com dedicação, devoção, fidelidade e
profissionalidade".
Francisco ressalta que "as resistências, as fadigas e as quedas"
também são "ocasiões de crescimento e nunca de desencorajamento", uma
oportunidade para "voltar ao essencial", ou seja, para "fazer as contas
com a consciência que temos de nós mesmos, de Deus, do próximo, do
sensus Ecclesiae e do sensus fidei".
Portanto, no Ano da Misericórdia, o papa propõe um "subsídio
prático", um "catálogo das virtudes necessárias" para quem "presta
serviço na Cúria" e para todos aqueles que querem "tornar fértil o seu
serviço à Igreja", convidando os chefes de dicastério "a enriquecer e a
completá-lo". É uma ''análise acróstica" da
palavra "m-i-s-e-r-i-c-ó-r-d-i-a", "como fazia Matteo Ricci na China".
O "catálogo das virtudes" se articula, assim, em torno das 12 letras que a compõem:
- Missionariedade e pastoralidade
- Idoneidade e sagacidade
- Spiritualità [espiritualidade] e humanidade
- Exemplaridade e fidelidade
- Racionalidade e amabilidade
- Inocuidade e determinação
- Caridade e verdade
- Onestà [honestidade] e maturidade
- Respeitabilidade e humildade
- Diviciosidade e atenção
- Impavidez e prontidão
- Affidabilità [confiabilidade] e sobriedade
Missionariedade e pastoralidade
A missionariedade "é o que torna e mostra a Cúria fértil e fecunda",
enquanto "a pastoralidade sã é uma virtude indispensável especialmente
para todo sacerdote", e "a medida da nossa atividade curial e
sacerdotal". E "sem essas duas asas – diz o papa – nunca poderemos voar,
nem mesmo alcançar a bem-aventurança do 'servo fiel'".
Idoneidade e sagacidade
A primeira "requer o esforço pessoal de adquirir os requisitos" para
"exercer da melhor forma possível as próprias tarefas e atividades, com o
intelecto e a intuição". E "é contra as recomendações e os subornos". A
sagacidade é "a prontidão de espírito para enfrentar as situações com
sabedoria e criatividade". Idoneidade e sagacidade representam "o
comportamento do discípulo que se volta ao Senhor todos os dias".
Spiritualità [espiritualidade] e humanidade
A espiritualidade é "a espinha dorsal de qualquer serviço na Igreja e
na vida cristã". A humanidade é "aquilo que encarna a veridicidade da
nossa fé", aquilo "que nos torna diferentes das máquinas e dos robôs que
não sentem e não se comovem. Quando nos é difícil chorar seriamente ou
rir apaixonadamente, então começou o nosso declínio e o nosso processo
de transformação de 'homens' em outra coisa qualquer". Espiritualidade e
humanidade devem ser realizadas inteiramente, continuamente,
diariamente.
Exemplaridade e fidelidade
Exemplaridade "para evitar os escândalos que ferem as almas e ameaçam
a credibilidade do nosso testemunho". Fidelidade à "nossa consagração, à
nossa vocação". Aqui, o papa cita as terríveis palavras de Jesus sobre
quem escandaliza os pequenos: seria melhor para ele se jogasse nos
abismos. "Quem é fiel no pouco também é fiel no muito; e quem é
desonesto no pouco também é desonesto no muito (Lc 16, 10)", e "quem
escandaliza mesmo que um só destes pequeninos que creem em mim, seria
melhor para ele que lhe fosse suspensa no pescoço uma pedra de um moinho
e fosse jogado nos abismos do mar" (Mt 18, 6-7)".
Racionalidade e amabilidade
A primeira "serve para evitar os excessos emotivos"; a segunda, "para
evitar os excessos da burocracia e das programações e planejamentos".
Todo excesso, observa Francisco, "é índice de algum desequilíbrio".
Inocuidade e determinação
A inocuidade "nos torna cautos no juízo, capazes de nos abster de
ações impulsivas e apressadas". A determinação é "agir com vontade
resoluta, com visão clara e com obediência a Deus" e só pela lei suprema
da salvação das almas.
Caridade e verdade
"Duas virtudes indissolúveis da existência cristã, a tal ponto que a
caridade sem verdade se torna ideologia do bonismo destrutivo, e a
verdade sem caridade se torna judiciarismo cego."
Onestà [honestidade] e maturidade
A honestidade é "a retidão, a coerência e o agir com sinceridade
absoluta com nós mesmos e com Deus". Quem é honesto age retamente mesmo
quando não há supervisores ou superiores. "O honesto não teme ser
surpreendido, porque não engana nunca quem confia nele." E "nunca
domina sobre as pessoas ou sobre as coisas que lhe foram confiadas".
Enquanto a maturidade é "a busca de alcançar a harmonia entre as nossas
capacidades físicas, psíquicas e espirituais".
Respeitabilidade e humildade
A primeira é dom das pessoas que "buscam sempre demonstrar respeito
autêntico aos outros, ao próprio papel, aos superiores e aos
subordinados, às práticas, aos papéis, ao sigilo e à confidencialidade".
A humildade é a virtude "das pessoas cheias de Deus que, quanto mais
crescem em importância, mais cresce nelas a consciência de não serem
nada e de não poderem fazer nada sem a graça de Deus".
Diviciosidade [doviziosità] e atenção
Assumindo mais um "neologismo", explica o papa, é inútil "abrir todas
as portas santas de todas as basílicas do mundo se a porta do nosso
coração está fechada ao amor, se as nossas mãos estão fechadas para dar,
se as nossas casas estão fechadas para o hospedar e se as nossas
igrejas estão fechadas para acolher. A atenção é cuidar dos detalhes e
oferecer o melhor de nós e nunca baixar a guarda sobre os nossos vícios e
falhas".
Impavidez e prontidão
Isto é, "não se deixar assustar diante das dificuldades" e "agir com
audácia e determinação e sem tepidez". A prontidão é "saber agir com
liberdade e agilidade, sem se apegar às coisas materiais temporárias",
sem nunca "se deixar pesar acumulando coisas inúteis e fechando-se nos
próprios projetos, e sem se deixar dominar pela ambição".
Affidabilità [confiabilidade] e simplicidade
Confiável é "aquele que sabe manter os compromissos com seriedade e
fidedignidade quando é observado, mas sobretudo quando se encontra
sozinho" e "nunca trai a confiança que lhe foi concedida". A sobriedade é
"a capacidade de renunciar ao supérfluo e resistir à lógica consumista
dominante". É "olhar o mundo com os olhos de Deus e com o olhar dos
pobres e ao lado dos pobres". Sóbria "é uma pessoa essencial em tudo,
porque sabe reduzir, recuperar, reciclar, reparar e viver com o sentido
da medida".
Francisco concluiu o seu discurso pedindo que seja a "misericórdia
que guie os nossos passos, que inspire as nossas reformas, que ilumine
as nossas decisões". Que seja ela que "nos ensine quando devemos seguir
em frente e quando devemos dar um passo para trás".
E citou uma oração dedicada ao Bem-aventurado Óscar Romero pelo cardeal estadunidense Dearden:
"De vez em quando, ajuda-nos dar um passo atrás e ver de longe... Somos
operários, não mestres de obras, servidores, não messias".
Avvenire, 21-12-2015
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